sexta-feira, 30 de abril de 2010

25% de Infelizes

"Você pode trocar de cara-metade, de partido, de candidato, de marca, de sexo, de casa, de país. Mas não troca de time. Você pode mentir para sua família por causa de sua paixão futebolística. Mas não vai mentir para um pesquisador qual é o seu clube. Aliás, em alguns casos, a resposta não é nem 'clube' - é 'time'. Tem gente que torce contra o futsal e o basquete só para não gastar torcida. Se você não entende isso, não entende a inexplicável paixão do futebol.
São 29% de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza num país injusto socialmente. São ainda muitos 21% de analfabetos funcionais. Mais ou menos 20% da população ainda não tem acesso ao saneamento básico. Outros tantos índices preocupantes ainda infelicitam o cidadão. Mas há uma porcentagem que não muda, e que deixa a expectativa de vida do brasileiro ainda menor, por mais que ela aumente literalmente com os anos: a porcentagem dos que nasceram no assim chamado País do Futebol que não gostam de futebol neste país.
A última pesquisa do Datafolha mostrou o que quase todas demonstram todos os anos, desde a primeira, do Ibope, em 1981: existem mais torcedores do Nenhum Futebol Clube que do Flamengo. São 25% que não torcem por time algum. São 25% que não assistiram ao biribol entre os mais de 40 milhões (ou mais) que são Flamengo e Corinthians; um quarto dos brasileiros não quis ver o jogaço e a bela vitória do Atlético Mineiro sobre o Santos, pela Copa do Brasil; são 25% que não viram o Universitário que levou bomba empatar um jogo medíocre contra o São Paulo; é a maioria que não viu o Inter mais uma vez jogar mal e mais uma vez perder uma decisiva em 2010, desta vez contra o Banfield.
Com o respeito a quem pensa diferente, são 25% de infelizes. Gente que não sabe o que é acordar mais feliz do que qualquer outro numa segunda-feira de vitória; gente que não prefere morrer quando o domingo foi de derrota. Gente que não desopila fígado a cada 90 minutos. Gente que não abre o coração a cada belo lance. Gente que não vive. Que não tem por quem torcer. Que não tem por quem amar. Que não tem por quem odiar.
Uma amiga detesta o futebol com paixão. Ela diz que adoraria ter o amor que a família tem por um time para extravasar. Que talvez entendesse melhor o mundo e o marito se soubesse como é incompreensível esse ritual que felicita e facilita 75% dos brasileiros. Prazer que há 20 anos é o meu ganha-pão, que há 43 anos é o meu perde-cabelo.
Não importa quem tem mais ou menos gente torcendo. É tudo margem de erro. Mas nada é mais errado do que os 25% de infelizes que não sabem o que fazer aos domingos."

(Mauro Beting)

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